segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Loucos desde muito tempo


Nasci e me criei no bairro da Parada Inglesa, na zona norte da capital.
Desde pequenino eu me acostumei a vê-lo por lá. A principio sentia medo dele, mas depois, conforme fui crescendo me acostumei com ele e o medo foi passando. Seu nome era João, mas a gente o conhecia por João Louco ou João Sonho, porque ele tinha um grave problema intelectual. O João era enorme, forte como um urso, mas, totalmente inofensivo; fazíamos mais mal a ele que ele a nós, principalmente quando algum idiota dava-lhe bebida alcoólica, que interagindo com os fortes remédios que ele tomava, deixava-o lunático.
Já adulto, tive que me afastar do meu bairro, por conta da perseguição política, da qual fui vítima, era o tempo cruel da ditadura militar.
No final da década de setenta, já com a anistia, voltei ao meu bairro e o João continuava por lá.
Certo dia, no portão de minha casa, conversando com ele, em seu estado normal, digamos assim, descobri que o João era corintiano e naquele dia ele me surpreendeu. O homem sabia tudo do Corinthians, era uma enciclopédia ambulante do Corinthians. Os principais jogadores, os times mais famosos, os principais dirigentes, as principais datas, os principais títulos e por ai vai.
Mudei-me de lá e hoje não sei mais dele, não sei mesmo se ainda está entre nós, mas hoje, quando escuto a torcida do Corinthians gritando que somos um bando de loucos, lembro-me dele e chego à conclusão que louco somos há muito tempo.
Tai ou estava o João que não me deixa mentir.

Por Marco Aurélio Loureiro

9 comentários:

Miguel S. G. Chammas disse...

Marco, teu texto tão bem escrito não me permite registrar qualquer outro comentário a não ser COITADO!
Ninguem, lógico, ´perfeito, mas ser corinthiano é um poico demais não acha?
Eu bacho.
E tenho benedito!
Sou extremamente verde até na 3a. divisão.....

Soninha disse...

Olá, Marcos!

Seja bem vindo entre nóa!

Em nosso bairro,lá na Vila Prudente, também tinha alguns "loucos" e que a meninada saia correndo de medo quando eles passavampela rua...rss
Mas, tinha uma senhora negra, gordinha e meio corcunda, que nós a apelidamos "mulher de bico", pois ela tinha a boca bem carnuda, típico da raça negra... Ela passava levando sempre uma sacola...Minha avó nos disse que ela vinha de longe para comprar alimentos para sua família (tadinha). E, criançada, já viu né?!
Valeu, Marcos! Obrigada.
Muita paz!

Modesto disse...

Nos seus delírios, o João por incrível que possa parecer, pra sua defesa própria, sai a procura de alguém ou alguma que o defenda dos "ataques" da molecada, ele ignora completamente a força física que possue e passa a torcer pro Corinthian, o mais popular, segue religiosamente a máxima de Maquiavel: se não podes contra seus inimigos, junte-se a eles.
Parabéns, Marcos.
Modesto

Zeca disse...

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Marco Aurélio!

Todos nós - ou a maioria, pelo menos - temos histórias a contar envolvendo essas pessoas que nos acostumamos a chamar de "loucos"! O diferencial, na sua história, é que você soube respeitá-lo e até conversar com ele. E aí descobriu, surpreso, que ele tinha algo de especial, no caso, o amor pelo Corínthians! Talvez por isso ele fosse louco... risos. Desculpe o trocadilho, mas não resistí.

Abraço

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joaquim Ignacio disse...

Marco, tudo beleza? Após ler seu texto, de imediato simpatizei com o João. Apesar do rebaixamento mental, das poucas luzes, das medicações pesadas, das esbórnias etílicas provocados por pessoas mal intencionadas, o João tinha um cantinho de seu cérebro que primava por extrema lucidez: a circunvoluão cerebral conhecida mundialmente como Hélix Corinthianensis. A implantação do estudo dessa área do cérebro iniciou-se em 1910 por 5 loucos do Bom Retiro e, até hoje, vem intrigando os maiores neuropatologistas do país, aliás, a grande maiora deles acometidos da Síndrome do Amor pelo Corinthians (SAPC).
Espero que o João esteja por aqui ainda (e bem!) e receba meu corinthianíssimo abraço.
Ignacio

Arthur Miranda disse...

Enquanto isso por aqui: O cordão dos corintianos cada vez aumenta mais. O verde esta em extinção no Futebol Paulista, o Guarani a muito já era. E los porquitos da Turiaçu, estão todos comendo grama, fuçaram tanto seu Estadio que hoje ele jaz revirado tornou-se um monte de lama. Parabéns pelo texto sou louco igual a você e o João, somos todos ligados ao (SAPC),do nosso querido Ignacio.

Wilson Natale disse...

Loureiro: Gostei!
A vida está cheia de Joões-Ninguém. A gente os olha, os ouve e os reconhece quando passam ao longe, ou nós mesmos, por medo, precaução, passamos longe dele.
De repente, um dia, a gente os vê e o escuta. Então o louco deixa de ser louco e desorimos o ser humano que ele é. A nossa cegueira social se esvai e passamos a enxergar com a visão clara da razão.
Niguém é tão pobre, ou tão ignorante que não possa nos dar lições de vida.
Abração,
Natale

Wilson Natale disse...

Errei: Leia-se: descobrimos o ser humano que ele é.
Natale

Luiz Saidenberg disse...

Louco, pelas ruas ele andava...o coitado chorava, tornou-se até um vagabundo. Na loucura da descomunal cidade, o que se pode admirar realmente é que se possa manter a sanidade. Ou então cantar, como Piazolla:- Yo sé que estoy piantao, piantao, piantao...no vés que vá la Luna volando por Callao?